sexta-feira, setembro 19, 2008

Somos crianças de nós












Somos crianças de nós
Naquele lugar de olvido
Somos marés sem voz
Em guarda do seu destino

Somos a água que passa
Entre azuis luzentes
A brisa que canta e traça
Esse palrar de gente

Somos o sorriso constante
Sobre aquele que chama
O dizer de tão distante
Que vos enleia e abraça

A rama nascida somos
Programada na distância
Em dores jamais sofridas
Não sabidas na constância
De nossas vidas floridas
Da água que fez crianças
Como nós que vos enlaçam

Sussurros de toda a gente
Omitidos à distância


(imagem de Anne Geddes)

terça-feira, agosto 12, 2008

A semente






















Dizes-me que tudo é passado
e que as letras a teu lado
são meras curiosidades planas…
quando vejo a utopia incauta
te perseguir como lâminas,
fulgentes,
qual memória do vento na rama
indizente e, pela calada da noite,
a toda a hora brada e clama

Esse sentir de esperança e mágoa
omitido no vazio de horas cantadas
em desafio
de outras vozes no espaço,
restrito, alargado,
sob um silêncio
mais das vezes camuflado

Assim se restolha a semente
em poisio após a lavra
e, após um tempo ausente,
seus membros espalha,
lentos, ao sopro do vento,
numa terna canção de letras
no deserto ramificadas

Escuta! Ouve,
da rama o canto, a chama, e
na semente o sopro da calma.


(imagem Google)

sábado, agosto 02, 2008

Em tempo de espera




















Falamos de um terno amor,
de todo um tempo em espera,
num variável movimento
de olhos cansados

Um país imaginário nos tornamos,
na vertical postura das palavras,
convencionadas, planas,
dotadas ao ostracismo do luar

Sobre a moldura dos nefelibatas
corre lesta a noite rubra
num intocável inferno de asas

E dessa conversa muda
tanto de nós se afunda
do casulo a inundar
no gestual vapor do olhar


(minha participação para o jogo daqui )

Imagem Google

quinta-feira, julho 03, 2008

Singelo Canal

Teresa Gonçalves, apesar de só recentemente ter aderido às lides bloguistas, tem variadíssima obra publicada, da qual destaco "Olhar interior" (2003), "Entre dois nós" (2006) e a antologia "Porto em Poesia" (2004).

Como Ísis, um dos seus pseudónimos virtuais, participou em jornais, boletins e páginas poéticas nomeadamente no Brasil e Canadá.


Capa do livro

O lançamento do seu livro de poesia "Singelo Canal", com Prefácio dos Drs. Paulina de Sousa e Francisco Coimbra, terá lugar no próximo dia 9 de Julho, (quarta-feira) às 21,00 horas, na Feira do Livro da Maia, Praça do Dr. José Vieira de Carvalho, (antiga Praça do Município), com o apoio da Biblioteca Municipal da Maia.


Falar de amor

onde existe entre flancos
clamor da aurora
iremos falar de amor

sobre a chama
dos punhais cravados em combate
iremos falar de amor

nas ruas desertas
pela cortina do silêncio
iremos falar de amor

sobre todas as palavras
que não foram ditas
não dizemos palavras
frescas do acaso
falaremos de amor

amor de todo o tempo
inventado nas pupilas do sol
ao fecundar a terra.

(Poema de Teresa Gonçalves aqui)

terça-feira, junho 24, 2008

A Lenda













No início de um século remoto, em terras de Espanha,
o povo andava em sobressalto, apavorado.
Uns, atónitos, clamavam atando as mãos à cabeça
É coisa do diabo!”.
Outros, de joelhos no chão e olhos esbugalhados,
bradavam “É milagre!”, “O fim do mundo!”, “Oremos, irmãos!”.

Os senhores mais poderosos da época enviaram emissários
às origens da sabedoria com missivas secretas.

Ali se reuniram discretos e protegidos alquimistas, zelosos
e estudiosos pensadores, cogitando vasculhar o corpo da
loucura (assim lhe chamaram) a emergir em forma de
cotovelo da água.

Perante tal impossibilidade, os primeiros recolheram lodo,
raízes dadas à costa pela maré, pó de pedra da rosácea
da igreja da Madre del Mar, areia, algas, resquícios de sal, e
tudo misturaram com mezinhas, poções e cal.

Os eruditos debruçaram-se sobre volumosos livros, códices,
papiros e elaboradas equações matemáticas. Sem explicação
para o fenómeno, afirmaram “Aumentem o tributo ao povo!”,
Sacrifiquem-se cabritos!”, “Imolem-se os ímpios!”.

Todos os métodos usados de nada serviram.

Subitamente, para espanto de toda a gente, o mar aquietou.

Ainda hoje, naquele lugarejo isolado, conta-se aos mais
pequenos a lenda do tornado.


(minha participação no jogo das 12 palavras daqui )

sexta-feira, junho 13, 2008

Uma voz na pedra






























Não sei se respondo ou se pergunto.
Sou uma voz que nasceu na penumbra do vazio.

Estou um pouco ébria e estou crescendo numa pedra.
Não tenho a sabedoria do mel ou a do vinho.

De súbito, ergo-me como uma torre de sombra fulgurante.
A minha tristeza é a da sede e a da chama.
Com esta pequena centelha quero incendiar o silêncio.

O que eu amo não sei. Amo. Amo em total abandono.
Sinto a minha boca dentro das árvores e de uma oculta nascente.

Indecisa e ardente, algo ainda não é flor em mim.
Não estou perdida, estou entre o vento e o olvido.

Quero conhecer a minha nudez e ser o azul da presença.
Não sou a destruição cega nem a esperança impossível.
Sou alguém que espera ser aberto por uma palavra.


Poema de António Ramos Rosa

(imagem Getty Images)

quinta-feira, junho 05, 2008

Menina Marota

Em Setembro de 2005 assistimos ao nascimento do blogue Poesia Portuguesa cujo principal intuito sempre foi a divulgação de excelentes poetas nacionais deste mundo virtual, sendo, na sua maioria, desconhecidos.

A esta nobre e árdua tarefa de amor e dádiva empenhou-se a Otília Martel, conhecida pelo nick Menina Marota.

Pela projecção que a todos deste, bem hajas.

É chegado o momento de nos ofertares a tua sensibilidade traduzida em palavras impressas, esse teu "desnudar de alma" para o qual, estou certa, todos desejamos o maior sucesso.

Até ao próximo dia 15.

quinta-feira, maio 22, 2008

Inocência

























É amena a hora e o tempo casto.

Na flor, o orvalho da manhã
estende-se em planos
indeléveis, indefinidos, breves,
qual pena em mão de criança
que do sonho nada teme.

E, sorrindo à brisa, se balança
indiferente ao conselheiro sem idade -
exponente pluriforme da morte -
em incauta obstrução à vulnerabilidade.

É amena a hora e o tempo casto.

Da silhueta ténue da rosa-menina
urge afastar densos passos
sobrepostos na tapeçaria da vida.


(participação no 3º jogo daqui )

Pintura de Lucien Lévy-Dhurmer

segunda-feira, abril 28, 2008

Escrevo...




















Escrevo…
O teu nome de sombra num leito de chocolate
no envolvente degrau da espaçada memória.

Escrevo…
Omitindo a ténue licença do sol
despontado pela linha das flores,
na caixa em eterna viagem.

E, da vida,
teço outonais ramas de palavras
de infinitude suspensa.

Escrevo…
A inefável nudez da hora.


(minha prestação para o 2º Jogo daqui )

Pintura de Henry Asencio

sexta-feira, abril 11, 2008

Re-flexão


















Algo me diz que és passado
na suposição aberta de um engano.

Algo me dita palavras
de um outrora unificado
por ternos sorrisos
em pinceladas de água
quando em pontas dançava
a borda do sol poente
num oculto eternizado.

Agora, leves meus pés deslizam
sobre a rápida aproximação da calçada
talvez seguindo o rasto de outros passos,
antigos, que o tempo disfarça
em sombras de vento
que por mim correndo passam
no sentido contrário do caminho
que em silêncio me dança.



(pintura de Júlia Calçada)


Poema in "Transparência de Ser"

sábado, abril 05, 2008

Nuvens
























Dizem que são da mente espaços retidos
de quem sentindo se adentra;
Espiralados, volantes navios
ao fulgor dos beijos do vento;
O recosto dos deuses decidindo
do Homem o seu destino
que na Fortuna não pensa;
Densos rios jorrando pérolas
a quente ou frio;
Um borbulhar de correntes
suspensas, num tempo vazio;
Um acaso de alvas estradas
na pintura de um arco-íris;
Flocos de algodão doce
em afagos inter vindos;
Nas letras, respiro de verdes
num horizonte de anil
suave, qual canto omitido.


Tudo isso proverá o desatino
do poeta que à janela da noite se aninha
nos solfejos do silêncio como estigma
quando a utopia em lento fio desliza
e, sob o fumo do cigarro, canta
para além do não dito.


(pintura de Renné Magritte)


Poema in "Transparência de Ser"

sexta-feira, março 21, 2008

Dias























Tecemos nas horas dos dias
momentos inteiros.

Tecemos o vento, a brisa,
o mar a contento;
o canto do pássaro,
a voz que caminha
leve, nas rugas dos dias -
que não sinto… não sentes…-
e segue sozinha.

Tecemos estradas
nos alinhavos da vida;
luares, montanhas
por nós omitidas;
a lavra, a seara,
o espigueiro vazio;
a fome que nos passa
na quentura do frio;
a casa, a ponte,
o jardim florido no eixo do rio;
no espaço, o instante
do sol que se colhe;
na água, a magia
dos olhos sem norte
pela porta esquecida.

E assim vamos loucos e soltos
de tudo em olvido
pintando sorrisos
nas horas sem dias


(pintura de Rackman Undine)

quinta-feira, fevereiro 28, 2008

Em prata















Amanheceste em prata

Reflexo de ti maior
em união de águas

Assim se quer o Amor –
esperança e chama


(fotografia de autor desconhecido)


Poema in "Transparência de Ser"

sexta-feira, fevereiro 15, 2008

Ausência













"O homem põe e Deus dispõe"
seus passos
e, de atraso em atraso,
contam-se as horas dos dias inócuos,
contam-se as névoas sem colóquios,
na mudez constante
nesta aparente distância amante
num tempo escasso de instantes.

Assim seja! Assim se compreenda
no que tarda o sorriso
e a solícita demência.


(pintura de Juan Montes)


poema in "Transparência de Ser"

sexta-feira, janeiro 11, 2008

Nós, os outros























Nós, os outros, habitamos a textura
aquosa e impura da cidade adormecida
quando o negro nela se abate

Nós, os outros, abrigamos o frio
nos jornais remexidos,
aninhados no vazio dos recantos
que o cimento e a pedra calam

Somos gente sem nome nem destino
em tempo indeterminado;
andarilhos na mão que se estende,
vestidos de invisibilidade

Nós, os outros, também sonhamos
a metáfora ténue dos papeis gastos,
da vida a essência dos dias plenos
entre a existência dos muros lentos
levantados pela hibridez da hora em viragem

Assim caminhamos o esquecimento
sob a trama da luz baça da cidade


(imagem Google)

Poema in "Transparência de Ser"

domingo, dezembro 30, 2007

E...











na acalmia da noite floriu a luz …



“As pequeninas coisas” nasceram a 28, estão bem
e estamos muito felizes.
Agradeço-vos o apoio e as carinhosas palavras.
Para vós, meus amigos, um venturoso 2008.


(imagem do Google)

terça-feira, novembro 06, 2007

As pequeninas coisas












Mãe
Escuta a brisa que meu ventre abre
Na terra dos sonhos o canto das pequeninas coisas
De braços estendidos o enlevo do sorriso que as afaga
Aquele murmurejar de água soletrando o rio
Plácido

Mãe
Sente os dois mundos que em mim trago
Saboreando o néctar das coisas invisíveis e cândidas
Entre a música e a leveza da dança
No balanço certo das outonais cores
Em folhas irisadas e suaves

Seis meses, mãe, são caminhados
Na voz das pequeninas coisas
Sob o azul da luz e o verde dos laços


(pintura de Carivano)

Ouvir o poema na voz de Luís Gaspar
(desligar a música de fundo, p.f)

quarta-feira, outubro 24, 2007

Bamboo

































Impulsivas, envolventes, activas
São as palavras escondidas
No barulho líquido da memória
Palavras que pintam casos
Casos excertos de acasos
Cantigas, bailados, histórias

Repercutem por todo o lado
No branco por dentro sentido
Erosão ténue de um passado
Do tempo sem tempo onde habito

Ao longe, o fundo anilado
Me afaga e me acalma
Nos voos de contos contados -
Menina ainda criança -
Refúgio eterno de braços
Esbatidos na distância

E nos bambus coloridos
Cada nó define um traço
Das letras rebeldes, unidas
Pela força que caminha
Na memória líquida dos laços
Carinho de cor que embalo

Impulsivas, envolventes, activas
Na tela em silêncio deslizam
Sob o pincel de meus passos


(pintura de Jane Yechieli)

domingo, outubro 14, 2007

Setembro

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket


Intoxicados são o tempo e a vontade
sob o ar rarefeito dos aromas mortos
em branco adejado no que urge e faz demora
qual contrapeso no degrau compacto das horas

O silêncio esvaziado das vozes em mim cantadas
suave e lentamente dia fora
acarretam saudades dos trinados
em suspensa melodia aquosa

Assim se fez o Setembro da casa em obras

Mas quando as portas da noite se abrem
renasce em malhas de lã a vida
multiplicando mimosas flores nos dedos
onde apenas o amor dá sentido
no profundo sonho infinito
da árvore, do sol – terno aconchego –
etéreo jardim que me abriga


(pintura de Ana Vieira)

Poema in "Transparência se Ser"

sábado, setembro 08, 2007

Hora de ponta


pintura de Cecília Ferreira

Caminha-se na paralisia do tempo
em fragmentos dissipados
e cria-se a oclusão selectiva dos passos
na temperatura metódica da posse
que a luz indirecta tem e que abre
sobre a mesa do pão-nosso de cada dia
em trapos de mármore

No tumulto da hora de ponta
evanesce-se o sorriso
em deambulações automáticas
na superfície vertical dos hiatos
que, das tempestades invisíveis, são tributários
quais vidas em saldo
perante a irracionalidade do mundo
de que tu e eu fazemos parte

Assim desliza o tempo e a vontade.
E aqui, do meu canto,
embalo as frases sofridas
chegadas nas auréolas da chuva
pela Natureza derramadas
na eterna esperança
que Luz se faça


(Breve nota: Ausente por obras em casa
com carinho vos abraço.)


Poema in "Transparência de Ser"