
Chegavam pessoas aos pares e famílias inteiras, mais lentas ou
apressadas, crianças em correria, com o sorriso estampado
nas faces morenas, rosadas pelo frio que a noite enfeitava.
Do duro labor de cada dia, o pensamento cortava as asas ao
vento avistando o entusiasmo das gentes.
Junto ao adro da igreja, crepitava a fogueira no chão de terra
batida, lançando faúlhas no ar e línguas de fogo guloso que, com
seus bailados, tentavam afagar as estrelas seguindo a música em
compassos, que se ouvia.
Que lindo!… exclamava o povo.
Aspergiu-se água, não da benta que é pecado, por cima das
labaredas e nas brasas rubras, serenas, castanhas foram
lançadas já o vinho tinto corria de boca em boca, assim como os
nacos da boroa de milho que o padeiro cozera no forno vedado
com bosta fresca apanhada de manhãzinha.
Os mais afoitos, segurando as pontas da coragem que em jorros
de vaidade lhes surgiam no peito, saltavam a fogueira entre os
gritinhos das moçoilas e olhares de cumplicidade furtivos.
Pelos dedos singelos do povo, a noite corria sincera, despreocupada.
O Sôr Abade, distribuindo a palavra entre as gentes, sorvia, com
golinhos discretos, o sangue de Cristo que no sacrifício da missa
se oferecia.
E, sorridente, agradecia ao Firmamento por ver o seu
rebanho reunido nesta noite encantada trazida pelo São Martinho.